quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

LAST NIGHT

Não sei quando acabou ontem e começou hoje. Minhas habilidades de migrar do dia para a noite e para o dia de novo foram colocadas em prática. Guerreiro, com uma pint de Quilmes na mão às 10h percebi que finalmente estava bêbado sozinho. Ninguém queria conversar comigo no único bar aberto. Um tipo conquistador e eloqüente contava suas histórias sobre drogas para meninas de alguma província argentina, totalmente encantadas. Dois bêbados, um inclusive parecido com John Lennon, tentavam me usar pra chamar atenção de outros grupos, um grupo de putas muito feias continuavam me achando atraente e interessante até que uma mendiga pegou meu copo e numa golada terminou com o chorinho que eu guardava na caneca. Tava na hora de partir. Voltei para o hostel e me perdi na busca de uma fanta para o café da manhã. Aliás foi a primeira vez que tomei café da manhã no hostel. Muito animado, de roupa amarrotada, junto com aqueles gringos dormentes de sono, sem menor inspiração para entender meu espanho. Tinha ido afogar as angústias de um coração que começava a ficar carente e bater forte por tão pouco. Tinha ido sugar as últimas 24horas que tinha na cidade. Tinha ido lembrar e esquecer a noite anterior.

Acordei objetivo, disposto a encarar sozinho a jornada de conhecer os pontos turísticos. Havia 4 dias que eu estava na cidade e mal havia passado da metade. Retomei os mapas, o livro de viagem mas, para minha alegria, o grupo de amigos cariocas no qual eu estava totalmente envolvido, também queria continuar fazendo o turismo começado com certa preguiça no dia anterior.

O que posso dizer deste passeio de domingo é a capacidade que a prefeitura e a iniciativa privada tem para criar seu próprio turismo, se aproveitando da criatividade popular e transformando numa espécie de zoológico um lugar onde o perigo, a malandragem, a sujeira e pobreza viviam junto com a inspiração dos artistas. Assim vi o Caminito. Uma rua no meio do bairro abandonado La Boca que, graças a criatividade e alegria dos imigrantes que viviam ali, transformou-se em passeio de madame. Bibelôs, entretenimentos copiados da Europa, brasileiros, show de tango, sósia do Maradonna e muitos oportunistas se apertam nas duas ou três ruas coloridas consideradas seguras, sendo observados pela esperança de meninos que batem bola a poucos metros do estádio do Boca Juniors. Não chega a ser um Pelourinho mas as cores fortes nas casinhas e barracos nos lembra que estamos na América do Sul.

A feira de San Telmo, que tem o nome mais bonito que a própria feira, estava no final e um casal de dançarinos de tango sem disposição se apresentava na busca de um troco. Um grupo afinado também mostrava seu talento de frente para a igreja. Caminhávamos em busca de novidade e só encontrei em um outlet que ficou com alguns mangos meus. No final da rua um carnaval feito de atabaques reunia uns branquelos do leste europeu que ainda não sabem que a capital do samba não é Buenos Aires.
Propus sairmos sozinhos, só os homens para a última curtição. E tudo foi concordado na teoria. A noite passada foi dividida em vigília e angústia a hippie que eu queria pra mim, cujos olhos pareciam cortinas de teatro que se abrem para cima, lentamente revelando um cenários totalmente incompreensível a primeira vista mas não menos encantador.

Nada do previsto aconteceu e pelas tantas estávamos no quarto, cantando músicas brasileira para ela, que é austríaca e boliviana, que fala inglês, espanhol, alemão mas usa o silencio como ninguém para responder questões do coração. Ela ia e novamente dançaríamos nos olhando e não nos permitindo. Tinha que falar pra ela alguma coisa. Ser exato com sentimentos em outra língua que não se domina é algo difícil. Saiu te gusto mucho e só. Ela sorriu como se já soubesse e me deslocou dizendo algo sobre a distância. Aquele romance bobo de viagem escrevia suas últimas linhas em um beijo sem vontade e o pedido para que eu fosse sair com meus amigos. Ela voltou para o hostel e disse adeus.

Me restou seguir em frente e encontrar alguns dos cariocas numa boate pequena e bem provinciana perto do Av Córdoba. Mas o destino é como o vento que não tem vergonha de mudar de direção na hora que lhe dá na telha. Nos reunimos às brasileiras que já havíamos amanhecido sentados na Puente de La Mujer e nos adaptamos a noite portenha, seu fernet maldito, seu regaton intermitente e ao costume de começar a noite pelas duas da madruga. Creio que o conforto de estar falando a mesma língua nos seduziu a ambos, numa cumplicidade de amigos de infância. Dois casais se formaram. Dois casais dançaram. Dois casais partiram para o hostel onde, dentro do abraço, dormimos pela primeira vez em nosso país.

Um comentário:

Raíssa disse...

Viajei de novo com você por Buenos Aires. Do caralho, amigo!!! Beijocas